A vida por si só já é um dilema, quando pensamos nela de verdade então…
É da nossa natureza estarmos eternamente insatisfeitos e até lidamos bem com isso, mas quando pensamos em morar fora, parece que essa insatisfação aflora e que nunca havíamos passado por isso antes. A eterna insatisfação que me refiro é o emprego que já não agrada tanto, o namoro que está pela hora da morte, o curso que não era o que você esperava. Estamos em eterno conflito. Porém, longe disso ser ruim, aliás é muito bom. É bom porque estamos sempre na busca por um ideal, algo que ainda não realizamos, mas que já conseguimos vislumbrar e nem parece tão distante.
Ir
Antes de partirmos para o nosso novo destino de vida, somos um pacote recheado de muita ansiedade e angústia. Ficamos imaginando o que nos aguarda, como será a nossa nova casa, o novo país, o trabalho inédito, as pessoas que cruzarão o nosso caminho. Por vezes, até nos pegamos balbuciando o novo idioma que precisaremos falar e o agora onde estamos não nos serve mais. Somos triângulo e a nossa vida um quadrado. Claro, não chegamos nessa decisão de partirmos à toa. São tombos, são tropeços, são histórias, conquistas e derrotas que vão se acumulando no nosso currículo de vida até que “o que sempre foi normal” não nos agrada mais e precisamos mudar. E precisamos mudar logo. Se a vontade de partir despertou em você, lhe digo por experiência própria: não vai demorar muito até que você esteja colocando toda a sua vida em duas malas grandes.
Partida e Chegada
A partida não é fácil e embarcar no avião machuca. É dolorido deixar tudo para trás, mesmo que aquilo não faça mais tanto sentido na sua vida. Quando a gente parte para a nossa nova cidade, estado ou país muita coisa importante fica e isso nos parte ao meio. Mas pior e mais difícil do que a partida, é a chegada. Chegar é difícil, tudo é complicado, as pessoas não lhe entendem, a cidade não ajuda e é desconhecida, as pessoas não falam o seu idioma, o sotaque é estranho. O frio parece que vai cortar, a chuva parece que nunca para de cair e falta alguma coisa. Você se sente sozinho em meio a multidão, precisa ajeitar a sua vida, mas tem tanta coisa para fazer que fica perdido e nem sabe por onde começar. Tem que ter peito, tem que se encher de coragem, tem que respirar fundo para não desanimar.
Ficar
Dizem por aí que alcançar o sucesso e a fama nem é tão difícil, que o complicado mesmo é se manter no topo. Olha, a cada dia que passa, compreendo que com o morar fora é a mesma coisa. Organizar despedidas, idealizar um blog, vender as coisas pela internet, dar tchau para os amigos e familiares, colocar os documentos numa pastinha, fechar as malas e partir não é nem um décimo do começo de tudo. O começo mesmo será somente depois que tudo isso passar, depois que a novidade da partida se for. Aí sim, você vai se pegar num lugar estranho, sem ninguém, com o dinheiro contado no bolso, tendo que resolver a sua vida. Resolver a sua vida leia-se: encontrar lugar para morar, procurar emprego, ter todos os documentos na mão, ter uma conta de luz ou água no seu nome. Se partir é difícil, ficar é 1 milhão de vezes mais. Ter garra todos os dias, ter fé de que as coisas precisam e vão melhorar, que a vida um dia vai entrar no eixos e que a sua vez vai chegar. Além disso tudo, ainda tem a saudade e a distância e quando você achar que tudo está caminhando vai ter o encontro anual da sua família, o aniversário do seu irmão, o dia das mães e dos pais, o Natal. Sinceramente, ficar e se manter é para poucos, pouquíssimos.
livro “Morar Fora: sentimentos de quem decidiu partir”
Voltar
Quando o ficar se torna impossível, o que nos resta é voltar. E para que a decisão de voltar seja irreversível, saiba que esgotamos todas as nossas possibilidades. Claro, morar fora é um projeto de vida, é um investimento, uma poupança e poucas pessoas fazem isso pensando em voltar. É como um casamento e raras são as pessoas que se casam com data certa para o divórcio. Porém, a vida não é uma receita que se seguida corretamente resulta em algo delicioso. Existem percalços e acontecimentos que fogem do nosso controle, além disso para quem mora fora existem os tais sentimentos. Quando precisamos voltar, de uma forma ou de outra, sentimos que perdemos. Perdemos para a saudade, fomos derrotados pela exigência de força diária que nos foi feita sem dó nem piedade, foi o emprego que não deu certo, o namoro que se foi, o documento que não veio, a família que ia se desmanchar pela distância ou até mesmo o fato de que, talvez, por não nos conhecermos tão bem e ficarmos de frente com nós mesmos tenha sido assustador.
Porém, voltar não é sinônimo de derrota. Não é porque quando voltamos não somos os mesmos de quando partimos, porque aqui fora tudo é muito diferente e as experiências pulam na nossa frente dia após dia. Viemos de um jeito e voltamos de outros tantos jeitos. Somos mais receptivos às mudanças, uma despedida não é mais o fim do mundo é até começa a ser encarada como natural, a solidariedade nos inunda. Morar fora é crescer, é mudar, é amadurecer, é fazer amigos de várias partes do mundo. Por teimosia ou necessidade voltaremos, mas a vontade de partir nunca mais nos será tirada. Nunca.
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*Cláudio Abdo publica textos sobre a experiência de morar fora todas as semanas aqui no site Vagas pelo Mundo. Volte sempre!
2 Comentários
Muito obrigado Pedro pelo comentário, ficamos imensamente gratos.
E muito obrigado também por ter lido o texto, que bom que ele tenha significado forte parar você!
Grande abraço!
Excelente texto; leve e pontual.