Saiba mais sobre a nômade pelo mundo, a brasileira de 28 anos que mora fora há 5 anos e carrega na mala muitas histórias para contar.
“Nunca seremos os mesmos depois de partir pela primeira vez. Sempre deixamos uma parte de nós por onde passamos, e tudo isso vicia.”
Largar tudo e viajar o mundo. Quem nunca teve um pensamento próximo a este atire a primeira pedra. Acontece que entre pensar e fazer existe um longo caminho.
Mas há uma fatia, mesmo que pequena da população mundial, que já fez disto uma realidade. É o caso da viajante Júlia Paniz, 28 anos. A catarinense saiu de Blumenau com uma mochila nas costas e muitos sonhos na cabeça.
Jornalista de formação, Julia é dona de um passaporte bem carimbado e muitas aventuras e experiências únicas que segundo ela, fazem parte do caminho de evolução pessoal que vive a cada dia. Depois de passar por 33 países ela está vivendo mais uma aventura, desta vez na Austrália e conta diariamente a rotina em seu Instagram @juliapaniz.
Entrevista com Júlia Paniz, uma nômade pelo mundo
Júlia Paniz conversou com o Vagas pelo Mundo e conta nesta entrevista um pouco da sua aventura pelo mundo e pelo autoconhecimento.
VPM – Porque você decidiu sair do Brasil e quando iniciou a sua jornada no exterior?
Júlia – Minha aventura pelo mundo iniciou há cinco anos, quando no fim de 2013 parti para uma das experiências mais incríveis da minha vida. Sai de Blumenau com destino a Dublin, na Irlanda, com a intenção de estudar inglês.
A ideia era ficar entre 6 meses a 1 ano. Sempre tive o sonho de fazer um intercâmbio, poder falar inglês e me comunicar com pessoas de outras culturas e conhecer um pouco do mundo, mas nem imaginava onde esse sonho iria me levar. Seis meses se transformaram em quatro anos na Ilha Esmeralda, lugar que tenho um carinho enorme por tudo que vivi e aprendi.
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VPM – Por quais países você já passou?
Júlia – Foram quatro anos morando na Irlanda, mas fazendo viagens por vários países da Europa. Estudava e trabalha e quando conseguia uma folga, aproveitava para conhecer um novo cantinho desse mundo incrível que vivemos. Durante esse período voltei para o Brasil de férias, e fiquei na Itália durante dois meses. Há um ano, saí de Dublin para viajar pela Ásia durante seis meses, onde fiquei uma média de um mês em cada país que conheci. Agora, estou passando uma temporada na Austrália.
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VPM – Qualidade ou quantidade? O número de lugares a conhecer influencia nas decisões de que destino escolher?
Júlia – Em determinado momento da aventura, os números deixam de ser relevantes, devido às experiências que passamos a viver, a forma como passamos a enxergar o nosso mundo, as diferentes culturas e como isso influencia em cada situação em que nos permitimos viver.
Durante estes cinco anos, percebi que queria ir além do que apenas viajar para vários lugares e colecionar carimbos no passaporte. Eu queria poder vivenciar e aprender com o que cada lugar teria para me ensinar. Durante estes cinco anos passei por 24 países na Europa, morando em um que foi a Irlanda, 8 países na Ásia (Índia, Nepal, Malásia, Indonésia, Mianmar, Vietnam, Cambodia e Tailândia) e a Austrália na Oceania que é o segundo país fora do Brasil que escolhi para morar.
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VPM – Na sua viagem de autoconhecimento na Ásia qual foi o momento em que mais sentiu liberdade?
Júlia – Acredito que os momentos que mais trouxeram liberdade foram aqueles em que eu estava conectada genuinamente com a cultura e com as pessoas que conhecia. Senti liberdade quando estava no campo base da Annapurna, mesmo estando em meio a montanhas e não ter como sair dali de outra forma que não fosse caminhando por alguns dias.
Senti liberdade pegando um ônibus noturno na Índia e me sentindo segura de estar fazendo aquela viagem. Senti liberdade meditando em um Ashram (casa para estudos do hinduísmo na Índia), durante um retiro de meditação e ioga. Senti liberdade viajando em um pequeno caminhãozinho de uma cidade para a outra no Mianmar, somente com moradores locais, compartilhando um momento único de aprendizado.
Senti liberdade viajando parte do Vietnam de moto, sozinha. Senti liberdade em momentos muito simples, mas que me ensinaram muito e me mostraram que liberdade está na verdade dentro da gente.
VPM – Quais as principais diferenças culturais e comportamentais você destacaria em relação ao Brasil?
Júlia – Dentre as principais diferenças comportamentais e culturais, a que mais me chamou atenção foi a simplicidade das pessoas. A vida vivida realmente como ela é. Em praticamente todos os países que conheci na Ásia, pude notar a mesma situação: pessoas muito simples, vivendo com muito pouco e sempre com um sorriso no rosto, dispostos a ajudar. Não que eu ache que no nosso país não tenha isso, porque em todo lugar que fui os brasileiros sempre são reconhecidos como um povo feliz e batalhador. Mas o fato de ver pessoas em situações muito precárias e sempre oferecendo um sorriso, me fez repensar muito do que é prioridade na minha vida.
A questão da religião também é bem forte. O budismo, o hinduísmo e o islamismo são as principais e são praticadas a sério em todos os países. A conexão com a espiritualidade me chamou muito a atenção e inclusive a questão dos rituais que são feitos todos os dias, de forma bem disciplinada.
A adoração e respeito com a natureza também foi algo inexplicável, onde rios, montanhas e mares são adorados como Deusas e Deuses, e a força deles é sempre ressaltada.
Outro fator que chamou minha atenção foi como tudo acaba funcionando, mesmo em meio ao grande caos. O trânsito, as buzinas, animais na rua, lixo, e muita gente, principalmente nas grandes cidades. E mesmo assim, tudo flui. Algumas diferenças na relação dos papeis de homem e mulher na sociedade também me fez questionar muito, mas sempre com respeito e entendendo que se estou em outro país, preciso compreender o que tenho para aprender com aquela situação.
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No Mianmar, as mulheres não podem se aproximar de altares na religião Budista, na Índia, elas não podem assistir as cerimônias de cremação a beira do Ganges (entre outras situações), em quase todos, é preciso tampar ombros e pernas, até mesmo na rua.
Tudo isso faz parte de tradições milenares e estão principalmente ligadas as religiões, que colocam o masculino como a principal fonte de energia e criação. Porém vejo tudo isso como grande aprendizado. Um amigo que conheci na Índia, depois de eu ter afirmado que tínhamos muito a aprender com eles disse: E nós, com vocês. A troca é mutua.
VPM – É preciso ter muito dinheiro para viver essas experiências? Como se preparar com grana?
Júlia – É preciso planejamento e força de vontade para fazer acontecer. Não adianta falar que sonha em viajar para fora do país, mas não abrir mão de absolutamente nada para que isso aconteça.
Para chegar à Irlanda, paguei meu curso de inglês parcelado em mais de 12 vezes. Para viajar pela Europa enquanto estava na Irlanda, abri mão de comprar coisas desnecessárias, que seriam acumuladas e ficariam guardadas. É preciso investir energia nas decisões certas para conseguir realizar tudo que sonhamos. E ai, naturalmente, o dinheiro vai ser um meio para que esse sonho se realize.
Para fazer a minha viagem de seis meses pela Ásia eu trabalhei muito, por várias semanas, fiz um cofrinho com todas as gorjetas que ganhava no café onde trabalhava, e priorizei o que era essencial para mim naquele momento. Querer comprar roupa toda semana, sair para beber aos fins de semana, gastar com coisas supérfluas, não é uma opção para quem quer viver experiências pelo mundo.
Outro fator importante é o tipo de experiência que a pessoa quer viver. No meu caso, eu vou sempre pelo mais econômico e simples. Fico em hostels, quando posso compro comida no supermercado em vez de comer o tempo todo em restaurantes, priorizo aproveitar o dia pra conhecer um lugar novo do que gastar uma grana saindo para beber, procuro opções mais baratas de transporte e por ai vai. São escolhas que fazemos antes e durante, que tornam tudo possível de ser realizado, nem sempre com tanto dinheiro como muitos imaginam.
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VPM – Nem tudo são flores, é preciso que as pessoas saibam que para viver as aventuras que você viveu e vive, é fundamental estar preparada para uma intensa jornada. Que conselhos você daria para quem pensa em fazer o mesmo?
Júlia – Sim, de fato nem tudo são flores. A vida na estrada e fora do Brasil parece somente linda e bela se vista apenas pelo feed do Instagram ou de qualquer outra mídia social. Mas não é somente. Os aprendizados são infinitos e acontecem o tempo todo.
É preciso abrir mão de muita coisa e ter certeza de que esse é o seu sonho e que isso vai te fazer realmente feliz. É preciso um pouco de coragem, mas sempre lembrar que também a coragem a gente constrói com o tempo. É preciso acreditar que aquele é o caminho certo a seguir, e principalmente estar aberto aos aprendizados que cada lugar vai te proporcionar.
Estar aberto ao novo, ao diferente, ao que você nunca viu ou experimentou ou imaginou existir. É preciso estar preparado para sentir, intensamente. Sabendo que cada viagem nos transforma de uma forma diferente, e que nunca seremos os mesmo depois de partir pela primeira vez. Que sempre vamos deixar uma parte de nos em cada canto que formos. E que tudo isso vicia.
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VPM – Quando a saudade pegou mais forte?
Júlia – A saudade sempre esteve comigo, mas o fato de saber que as pessoas que eu amo sempre me apoiaram muito em todas as minhas decisões alivia o aperto em muitos momentos. Ela bate mais forte quando vejo que o tempo esta passando, quando acontece algo especial na vida de alguém, e eu não estou presente fisicamente para celebrar aquele momento junto. Ou quando eu estou vivendo algo que gostaria de compartilhar com alguém que amo. Mas ao mesmo tempo, a conexão que tenho com as pessoas que são presentes em minha vida, vai muito além de qualquer sentimento de falta que posso ter.
VPM – Do que você sente mais falta? De quem sente mais saudade?
Júlia – Sinto muita falta das pessoas que amo. Família e amigos. Os que estão no Brasil e agora também os que fiz pelo mundo. Mas todos eles sempre me apoiaram muito nas minhas decisões, o que faz tudo ser mais leve. As duas pessoas que mais sinto saudades sem duvidas é a minha mãe e a minha avó. Tenho um laço muito forte com as duas e muitas vezes queria tê-las mais perto de mim.
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VPM – Quais os destinos que ainda esperam por você?
Júlia – Muito difícil determinar um número exato, porque meu sonho é viajar o mundo. Quando comecei a viajar, encontrei nesse estilo de vida algo que me faz inteiramente feliz. Quero conhecer diferentes culturas e passar por outros continentes, principalmente o nosso.
Tenho muita curiosidade pelos países da África, mas também quero muito viajar pela Ámerica do Sul e principalmente aprofundar na cultura brasileira. Mas dois países que estão no topo da minha lista são Nova Zelândia e Islândia. Sei que ambos reservam algo muito especial para mim, principalmente pela conexão que tenho com a natureza.
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VPM – Agora um desafio, responder um jogo rápido escolhendo uma cidade, país ou local para cada um
- Uma paisagem: A cadeia de montanhas Annapurna vista do Campo Base, no Nepal.
- Um cheiro: da praia, quando cheguei à Austrália.
- Um sabor: Chai indiano (o chá deles, preparado com chá preto, vários temperos e leite).
- Uma sensação: De estar fazendo aquilo que me faz transbordar, sentir, evoluir. De seguir o meu coração por onde ele me levar.
- Uma conversa: Conheci uma francesa no meu primeiro dia no Myanmar e acabamos seguindo viagem juntas durante 28 dias. Todas as nossas conversas foram muito marcantes para mim.
- Um perrengue: Tempestade em meio a uma trilha nos Himalayas.
- Uma festa: Festival das Cores, na Índia (Holi Festival).
- Um momento inesquecível: Pôr do Sol na Indonésia.
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